quinta-feira, setembro 01, 2011

Rabelo: Abrir caminho para mudança da política macroeconômica


A decisão do Copom em reduzir a meta da taxa de juros em 0,5% nesta quarta-feira demonstra um esforço de convergência entre os objetivos das políticas fiscal e monetária. O compromisso anunciado na segunda-feira passada pela presidente Dilma Rousseff de que seria mantida a austeridade fiscal neste exercício para abrir espaço para uma redução da taxa de juros foi para valer e já se iniciou.

Por Renato Rabelo*

Demonstra oportuna articulação entre o governo e o Banco Central. Agora o país se sentirá mais seguro para enfrentar as possíveis consequências da crise internacional.

O PCdoB saúda esse resultado positivo do governo Dilma. Entendemos que a decisão do Copom promove o equilíbrio do custo social decorrente da austeridade fiscal com os benefícios econômicos e também sociais de uma redução na taxa de juros. Esperamos que essa redução tenha também como consequência uma mudança da taxa de câmbio, tornando-a mais compatível com os interesses da produção nacional e com a competitividade de nossas exportações. A reação de círculos dominantes financeiros – através de porta-vozes de plantão – veio na hora demonstrando sua contrariedade, afirmando, intempestivamente, que aconteceu uma “guinada no Banco Central”, os “desenvolvimentistas venceram” e que o “Banco Central termina aí sua independência”.

Opinamos que dois movimentos poderão ser feitos seguindo a lógica defendida pela presidente.

Primeiro, confiamos que a queda na meta da taxa de juros do Banco Central iniciará, agora, uma trajetória descendente e prolongada para que se cumpra o objetivo do governo Dilma de equiparar a nossa taxa de juros às taxas de juros das principais economias do mundo até o ano de 2014.

Segundo, esperamos, também, que o objetivo de se desindexar a dívida pública com a extinção paulatina dos títulos do Tesouro remunerados pela taxa Selic seja alcançado no menor espaço de tempo possível. A indexação desses títulos à Selic, uma taxa de juros que varia diariamente, é uma herança dos governos neoliberais, que há anos premia os rentistas com ganhos elevados sem nenhum risco. Esses títulos prejudicam a ação do Banco Central sobre os juros e geram um custo elevado e desnecessário para o Estado brasileiro.

Atualmente esses títulos indexados à Selic representam cerca de 30% da dívida pública. Embora essa participação venha se reduzindo desde 2003, quando representavam até 60% do total da dívida, é necessário agora acelerar sua extinção. O volume desses títulos representa ainda hoje um grande custo fiscal: cada um por cento de aumento na taxa de juros do Banco Central representa uma perda anual para o Tesouro Nacional de até R$ 600 milhões. O PCdoB espera que os títulos indexados à Selic venham a ser extintos em prazo menor do que a do exercício de 2014.

Estes dois movimentos imediatos e contínuos – queda progressiva dos juros e desindexação da dívida pública da taxa Selic – abrem caminho para mudança da política macroeconômica, sendo o caminho certo para enfrentar a dimensão da crise financeira e econômica mundial, defender a economia nacional, incentivar o investimento e o emprego em nosso país para tornar realidade o novo projeto nacional de desenvolvimento.

Brasília, 31 de agosto de 2011

* Renato Rabelo é presidente Nacional do PCdoB


sexta-feira, agosto 26, 2011

... E tudo depende dos Juros

Pra começar este artigo afirmo que apóio o governo Dilma, sem dúvidas, e afirmo também que como qualquer governo em tempos de transição, o governo Dilma vive em uma grande disputa de rumos que somente será vencida em favor da maioria da população e de um novo projeto de desenvolvimento, se a força da pressão por mudanças estruturais e democratizantes for maior que a força do conservadorismo, sobretudo macroeconômico.

Mas, vamos lá...

É comum nas rodas de conversas políticas ouvir-se falar de um tal de Juros: Que este ano tem invarialvelmente subido, que tem impacto negativo no crescimento econômico, mas, que também é necessário para conter a inflação. A mídia em geral fala em medidas macroprudenciais e tal.
Mas o que é isso realmente e o que tem haver com a nosa vida cotidiana?
Vou tentar, sem ser longo, explicar no que isso nos interessa. Difícil.

Os juros, em miúdos, são um valor que o governo paga para quem comprar a sua dívida. Você já viu algum anúncio de crédito pessoal que diz: "Compramos sua dívida"? Já? Pois o governo, que tem dívidas como qualquer cidadão, vende a sua dívida e diz ao comprador que pagará, daqui a 01 ano, 12,50% a mais (em valores atuais).
Essa oferta é feita por alguns motivos, o principal deles, hoje é conter a alta dos preços, ou seja, a inflação, pois, se o país cresce, isso quer dizer que cresce a quantidae de empregos, por exemplo, pois abrem-se novas empresas para fabricar ou vender qualquer coisa. Assim, o povo tem mais dinheiro pra gastar (aumento da demanda). Aumentando a demanda, claro, os produtos são mais disputados e o preço sobe (pois existem os sabidos que querem ou têm que faturar mais por casa disso). Isso gera a inflação. Escrevo de forma grossa, apenas para ilustrar. Isso seria o curso normal da questão. Então, quando se aumenta os juros, tudo fica mais caro, pois fica mais caro também fabricar e/ou vender qualquer produto, porque o dinheiro usado para fazer isso geralmente é emprestado também. O povo deixa de comprar e o preço não sobe.
Esse é um dos principais motivos do aumento dos juros: Combater a inflação, chaga econômica mais temida por todo o povo.
Agora, voltando à explicação, sabe o que acontece quando se aumenta os juros? Uma absurda transferência de renda de quem pode produzir e gerar renda no país, para quem apenas compra a dívida do governo. Sabe como é? É assim:
Os juros são decididos por menos de dez pessoas todos os meses. Todos eles tem ligação direta ou indireta, explícita ou implícita com chamado mercado financeiro (que compra a dívida do governo). Antes da reunião do Órgão que decide tudo (o Copom) é feita uma consulta a analistas do tal mercado finaceiro sobre o que eles pensam sobre os juros no próximo período. Tipo assim: "Você acha que os juros devem subir ou não?" O que você acha que os tais consultores respondem? Claro que "sim". Por quê? Porque eles serão os maiores beneficiados com isso, sabe como? Pegando dinheiro emprestado em qualquer local do mundo (pois os juros são mais baratos. Nos EUA, mesmo, é de 1% ao ano) e compra a dívida brasileira que pagará a ele 12,50% ao ano. Entendeu? É um grande investimento sem derramar nenhuma gota de suor. É o melhor investimento do mundo! Então, a receita é sempre a mesma: Toda vez que a inflação sobe, tem que se aumentar o lucro dos parasitas. É a oferta de sacrifício ao deus mercado que derrubará a inflação.

Ocorre que a inflação não tem abaixado, apenas aumentado. Por quê, então? É o que um dos lados dessa batalha defende, porque a inflação no Brasil não é derivada da compra de produtos pela população. Pelo menos a maior culpa não é disso. Tem aumentado a Gasoilina e Gás, a energia e a água, a laranja, o tomate, a banana, etc. Tem aumentado o preço do carro novo, do ano? Não. Tem aumentado o preço de qualquer produto industrializado de alto valor agragado? Não. O que tem aumentado são os produtos agrícolas que são e não são comodities (café, trigo, soja e os já citados anteriormente). Os comodities porque seus preços oscilam mundialmente e afetam seu valor no mercado local (a reforma agrária combateria isso numa boa!). Os que não são comodities não tem seu preço determinado já para uma venda no futuro. Esses produtos estão sujeitos à mudança de valores o tempo inteiro. Basta dar uma geada ou uma seca a mais que determinada cultura não produz e o agricultor tem que aumentar o preço para compensar as perdas. Veja o feijão, por exemplo, você já pesquisou quantos valores ele tem durante o ano? Parte de 2 a 3 reais e chega aos 6 reais para depois voltar aos 2 a 3. Isso ocorre todos os anos, sempre. A outra parte que sobe são os chamados produtos com preços administados. Controlados pelo próprio governo. Gasolina, por exemplo, que influencia o preço de quase tudo no país. Então, o remédio de aumento de juros é ineficaz para combater a inflação.

No final das contas a dívida do Brasil cresce e a inflação também. O que não cresce é a distribuição de renda nem a renda das pessoas, ou seja o país não cresce. Para se ter uma idéia, estamos na safra de datas-bases de várias categorias de trabalhadores e dificilmente alguma está tendo aumento acima da inflação de 2010 (5,9%). Alguns estão tendo abaixo. O trabalhador não aumenta o seu salário porque o dinheiro está a aumetar o lucro dos rentistas. Hoje, cerca de 45% do Orçamento Geral da União é utilizado para pagar os juros, as amortizações e o refinanciamento da dívida (porque o governo acerta com o credor que, se ele não liquidar a dívida na data o governo paga mais. Claro que eu quero isso!). Para a habitação é tão pequeno que nem aparece nos gráfico. Tende a zero, mesmo com o Minha Casa, Minha Vida (Imagina o que se faria se fosse 2%!) Para o saneamento é 0,04%. Para dizer melhor, depois da dívida, o segundo lugar (desconto para a Previdência, 22%, e para as Transferências para Estados e Municípios, 9%) fica com a saúde, nem 4%. É por isso que quando dizem que quando se tem que ter aumento tem também que dizer de onde o dinheiro vai sair, eu já sei de onde deveria ser: Dos juros. É a fatia maior e mais perversa.

Para finalizar, a política de juros no país é extremamente danosa. Deve ser combatida pelos setores mais avançados da sociedade (que é maioria) e esclarecida ao povo em geral, de maneira a fazer o governo Dilma avançar mais e mais rápido.

Perdoem-me o simplismo dos argumentos, é apenas para elucidar um pouco, sujeito a erros. Muitas indagações devem surgir, mas, a resposta fica para após os comentários.

domingo, março 13, 2011

A educação no País e o Plano do Governo 1 - A Educação Superior

Volto a escrever algo próprio, embora ainda sério - o que pode afastar muitos leitores. Peço paciência.
Primeiro, gostaria de dizer que apoio o Governo Dilma, assim como apoiei o Governo Lula. Não se trata de apoio incodicional, nem mesm o em troca de cargos ou qualquer privilégio, mas apoio sob as condições políticas declaradas pelo meu partido o PCdoB.

Semana que passou foi divulgado o ranking com impressões (portanto, subjetivo) das melhores universidades do mundo, a mídia marrom tratou logo de desqualificar o Brasil a partir daí.

Vamos considerar que a subjetividade dos avaliadores esteja correta. Tudo bem.
Mas, em quantos anos se forma uma nação forte em termos de educação de qualidade? Um? Dois? Dez? Vinte? Quantos? Sei o seguinte: O país passou mais de 500 (!) anos com investimentos em educação míopes, excludente e a conta-gotas. A educação sempre foi tratada como privilégio de alguns. Sempre. Em todas as épocas. Muitas vezes de forma oficial, legalizada. Outras vezes de forma subliminar, como em décadas recentes, com o advento do vestibular. Assim, negros, pobres, minorias e tal, eram relegadas à subeducação. Tinham algumas alternatias para seguir seu destino de classes dominadas: Não estudavam para ir trabalhar; Estudavam o mínimo necessário para não serem taxados de analfabetos e poderem dirigir o carro do patrão; Trabalhavam o dia inteiro para pagar uma Uniesquina (muitos ainda fazem isso); ou se realizavam ao ver o filho furar o bloqueio e entrar numa FEDERAL (eu fui um dos que furou este bloqueio ou Deus furou por mim, verdade!). Os investimentos em educação sempre tiveram aumento ao longo da história, não poderia ser diferente, mas sempre com um olhar de que se tinha que investir apenas na educação básica, ou no ensino médio, ou no superior, ou - como maior estratégia de dominação - no profissionalizante. Não que eu seja contra, muito pelo contrário, mas já foi usado como estratégia para distender a pressão sobre o ensino superior.
Essa foi a pisada de cinco séculos.
Na última década, coube a um -que não furou o bloqueio - operário, com a 4ª série primária, carregando nas costas todo o preconceito de classe da elite brasileira (que é transferido, por seus meios, para uma parte oprimida da população), fazer a maior revolução educacional da história: Abriu o leque do acesso, apesar de a porta ainda ter que ser muito maior.
O ensino brasileiro, que a meu ver deve ser comparado com o Brasil, apenas, por questões culturais - a não ser no domínio da tecnologia de ponta em várias áreas do saber -, passou a ser de todos, inclusive dos negros que construíram TODA a base de nossa riquesa e foram históricamente cerceados de tal.
Sobre os negros e índios cabe um parágrafo à parte, permitam. Temos uma dívida econômica, social e cultural com eles. Dívida histórica. Constuiram o país e a nação unitária e após a libertação, sem bagagem alguma, tiveram que disputar de "igual pra igual" com os filhos da oligarquia. Ou seja, deixaram de ser escravos para serem os otários da elite. Da elite mais inteligente do mundo, a brasileira. As cotas não pagam nem um décimo de nossa dívida com eles. Ainda falta muito.
O mesmo raciocínio da disputa do "igual pra igual" serve para as cotas de escolas públicas.
Voltando para a revolução: No ano de 2002, existiam 531.634 alunos matriculados em Instituições Federais de Ensino Superior - IFES. O "analfabeto" assumiu e tomou a decisão de expandir as Univarsidades. Como? Construindo e aumentando vagas. Levaria tempo mas, a decisão estava tomada. Em 2006 eram 589.821 matriculados. Aumento pífio, mas falamos de educação, leva tempo. No final do ano passado eram na da menos que 1.010.491 alunos matriculados. Quase dobrou o número só nas Federais. Foram 15 IFES construídas e dezenas de campi avançados, veio também o Reuni. Além disso, veio o Enem pra derrubar o vestibular - e depois ser derrubado por algo mais avançado. Veio o Prouni (criado pelo governo Lula. FHC tinha apenas um FIES restritivo) que colocou cerca de 800 mil alunos pobres em privadas (muitas Uniesquinas, mas de graça, o trabalhador estudante pode guardar seu salário pra outra coisa), veio a remodelação do FIES, para democratizar, facilitar
e fazer justiça no acesso ao finaciamento, de forma que em 2002 existiam 3.479.913 alunos matriculados no ensino superior no Brasil e em 2010 esse número passou para cerca de 5.341.800 (não lembro o número exato).

As mudanças não param por aí. Ainda há que se falar no aumento de recursos, da formação da educação básica, profissionalizante. Do efeito que está gerando a mudança nas políticas educacionais no Brasil na relação dos alunos com as instituições de ensino. Da questão da repetência, das políticas de correção de fluxo, do Plano Decenal para a Educação, da participação popular nas decisões, dos desafios, dos erros ainda persistentes. Das perspectivas para o Governo Dilma. De várias questões que abordarei mais adiante. Por aqui é só.

Em tempo: Já que estamos falando nisso. Achei a indicação do Deputado Tiririca para a Comissão de Educação e Cultura da Câmara excelente. É o Brasil, finalmente, cuidando do Brasil.

Mídia

Vai mais um artigo sério de outros autores.
Agora é sobre o último terremoto ocorrido no Japão e suas relação com a ocupação humana, a mídia e o pensamento filosófico.

Pode ser acessado pelo sítio Carta Maior

Tragédias naturais como do Japão expõem perda da noção de limite

Nas catástrofes atuais, parece que vivemos um paradoxo: se, por um lado, temos um desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação, por outro, a qualidade da reflexão sobre tais acontecimentos parece ter empobrecido. A humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra e se aproxima cada vez mais de áreas de risco. A ideia de limite se perdeu e a maioria das pessoas não parece muito preocupada com isso.

por Marco Aurélio Weissheimer, na Carta Maior

No dia 1° de novembro de 1775, Lisboa foi devastada por um terremoto seguido de um tsunami. A partir de estudos geológicos e arqueológicos, estima-se hoje que o sismo atingiu 9 graus na escala Richter e as ondas do tsunami chegaram a 20 metros de altura. De uma população de 275 mil habitantes, calcula-se que cerca de 20 mil morreram. Além de atingir grande parte do litoral do Algarve, o terremoto e o tsunami também atingiram o norte da África. Apesar da precariedade dos meios de comunicação de então, a tragédia teve um grande impacto na Europa e foi objeto de reflexão por pensadores como Kant, Rousseau, Goethe e Voltaire. A sociedade europeia vivia então o florescimento do Iluminismo, da Revolução Industrial e do Capitalismo. Havia uma atmosfera de grande confiança nas possibilidades da razão e do progresso científico.

No Poème sur le desastre de Lisbonne (“Poema sobre o desastre de Lisboa”), Voltaire satiriza a ideia de Leibniz, segundo a qual este seria “o melhor dos mundos possíveis”. “O terremoto de Lisboa foi suficiente para Voltaire refutar a teodiceia de Leibniz”, ironizou Theodor Adorno. “Filósofos iludidos que gritam, ‘Tudo está bem’, apressados, contemplam estas ruínas tremendas” – escreveu Voltaire, acrescentando: “Que crimes cometeram estas crianças, esmagadas e ensanguentadas no colo de suas mães?”

Rousseau não gostou da leitura de Voltaire e responsabilizou a ação do homem, que estaria “corrompendo a harmonia da criação”. "Há que convir... que a natureza não reuniu em Lisboa 20 mil casas de seis ou sete andares, e que se os habitantes dessa grande cidade se tivessem dispersado mais uniformemente e construído de modo mais ligeiro, os estragos teriam sido muito menores, talvez nulos", escreveu.

Já Kant procurou entender o fenômeno e suas causas no domínio da ordem natural. O terremoto de Lisboa, entre outras coisas, acabará inspirando seus estudos sobre a ideia do sublime. Para Kant, “o Homem, ao tentar compreender a enormidade das grandes catástrofes, confronta-se com a Natureza numa escala de dimensão e força transumanas que, embora tome mais evidente a sua fragilidade física, fortifica a consciência da superioridade do seu espírito face à Natureza, mesmo quando esta o ameaça”.

A tragédia que se abateu sobre Lisboa, portanto, para além das perdas humanas, materiais e econômicas, impactou a imaginação do seu tempo e inspirou reflexões sobre a relação do homem com a natureza e sobre o estado do mundo na época. Uma época, cabe lembrar, onde os meios de comunicação resumiam-se basicamente a algumas poucas, e caras, publicações impressas, e à transmissão oral de informações, versões e opiniões sobre os acontecimentos. Nas catástrofes atuais, parece que vivemos um paradoxo: se, por um lado, temos um desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação, por outro, a qualidade da reflexão sobre tais acontecimentos parece ter empobrecido, se comparamos com o tipo de debate gerado pelo terremoto de Lisboa.

A espetacularização das tragédias e a perda da noção de limite

Em maio de 2010, em uma entrevista à revista Adverso (da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul), o geólogo Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da UFRGS, criticou o modo como a mídia cobre, de modo geral, esse tipo de fenômeno.

“Ela espetaculariza essas tragédias de uma maneira que não ajuda às pessoas entenderem que há uma manifestação das forças naturais aí e que nós precisamos saber nos precaver. A maneira como a grande imprensa trata estes acontecimentos (como vulcões, terremotos e enchentes), ao invés de provocar uma reflexão sobre o nosso lugar na natureza, traz apenas as imagens de algo que veio interromper o que não poderia ser interrompido, a saber, a nossa rotina urbana. Essa percepção de que nosso dia a dia não pode ser interrompido pela manifestação das forças naturais está ligada à ideia de que somos sobrenaturais, de que estamos para além da natureza”.

Para Menegat, uma das principais lacunas nestas coberturas é a ausência de uma reflexão sobre a ideia de limite. É bem conhecida a imagem medieval de uma Terra plana, cujos mares acabariam em um abismo. Como ficou provado mais tarde, a imagem estava errada, mas ela trazia uma noção de limite que acabou se perdendo. “Embora a imagem estivesse errada na sua forma, ela estava correta no seu conteúdo. Nós temos limites evidentes de ocupação no planeta Terra. Não podemos ocupar o fundo dos mares, não podemos ocupar arcos vulcânicos, não podemos ocupar de forma intensiva bordas de placas tectônicas ativas, como o Japão, o Chile, a borda andina, a borda do oeste americano, como Anatólia, na Turquia”, observa o geólogo.

Não podemos, mas ocupamos, de maneira cada vez mais destemida. O que está acontecendo agora com as usinas nucleares japonesas atingidas pelo grande terremoto do dia 11 de março é mais um alarmante indicativo do tipo de tragédia que pode atingir o mundo globalmente. O que esses eventos nos mostram, enfatiza Menegat, é a progressiva cegueira da civilização humana contemporânea em relação à natureza. A humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra e se aproxima cada vez mais de áreas de risco, como bordas de vulcões e regiões altamente sísmicas. “Estamos ocupando locais que, há 50 anos, não ocupávamos. Como as nossas cidades estão ficando gigantes e cegas, elas não enxergam o tamanho do precipício, a proporção do perigo desses locais que elas ocupam”, diz ainda o geólogo, que resume assim a natureza do problema:

"Estamos falando de 6 bilhões e 700 milhões de habitantes, dos quais mais da metade, cerca de 3,7 bilhões, vive em cidades. Isso aumenta a percepção da tragédia como algo assustador. Como as nossas cidades estão ficando muito gigantes e as pessoas estão cegas, elas não se dão conta do tamanho do precipício e do tamanho do perigo desses locais onde estão instaladas. Isso faz também com que tenhamos uma visão dessas catástrofes como algo surpreendente".

A fúria da lógica contra a irracionalidade

Como disse Rousseau, no século XVIII, não foi a natureza que reuniu, em Lisboa, 20 mil casas de seis ou sete andares. Diante de tragédias como a que vemos agora no Japão, não faltam aqueles que falam em “fúria da natureza” ou, pior, “vingança da natureza”. Se há alguma vingança se manifestando neste tipo de evento catastrófico, é a da lógica contra a irracionalidade. Como diz Menegat, a Terra e a natureza não são prioridades para a sociedade contemporânea. Propagandas de bancos, operadoras de cartões de crédito e empresas telefônicas fazem a apologia do mundo sem limites e sem fronteiras, do consumidor que pode tudo.

As reflexões de Kant sobre o terremoto de Lisboa não são, é claro, o carro-chefe de sua obra. A maior contribuição do filósofo alemão ao pensamento humano foi impor uma espécie de regra de finitude ao conhecimento humano: somos seres corporais, cuja possibilidade de conhecimento se dá em limites espaço-temporais. Esses limites estabelecidos por Kant na Crítica da Razão Pura não diminuem em nada a razão humana. Pelo contrário, a engrandecem ao livrá-la de tentações megalomaníacas que sonham em levar o pensamento humano a alturas irrespiráveis. Assim como a razão, o mundo tem limites. Pensar o contrário e conceber um mundo ilimitado, onde podemos tudo, é alimentar uma espécie de metafísica da destruição que parece estar bem assentada no planeta. Feliz ou infelizmente, a natureza está aí sempre pronta a nos despertar deste sono dogmático.

sábado, março 12, 2011

A VPR, a Ditadura Militar e Abreu e Lima

No dia 10 de janeiro de 1973, Abreu e Lima, mais especificamente a comunidade de São Bento, foi palco para um dos maiores massacres e traições dos anos de ditadura militar. Hoje lembrado por poucos, o acontecimento foi retrtado por Urariano Mota e publicado no vermelho(www.vermelho.org.br). Vale a pena ler.


Urariano Mota: Soledad, a mulher do Cabo Anselmo



Quem lê “Soledad no Recife” pergunta sempre qual a natureza da minha relação com Soledad Barrett Viedma, a bela guerreira que foi mulher do Cabo Anselmo. Eu sempre respondo que não fomos amantes, que não fomos namorados. Mas que a amo, de um modo apaixonado e definitivo, enquanto vida eu tiver. Então os leitores voltam, até mesmo a editora do livro, da Boitempo: “mas você não a conheceu?”. E lhes digo, sim, eu a conheci, depois da sua morte. E explico, ou tento explicar.

Por Urariano Mota*
Quem foi, quem é Soledad Barrett Viedma? Qual a sua força e drama, que a maioria dos brasileiros desconhece? De modo claro e curto, ela foi a mulher do Cabo Anselmo, que ele entregou a Fleury em 1973. Sem remorso e sem dor, o Cabo Anselmo a entregou grávida para a execução. Com mais cinco militantes contra a ditadura, no que se convencionou chamar “O massacre da granja São Bento”. Essa execução coletiva é o ponto. No entanto, por mais eloquente, essa coisa vil não diz tudo. E tudo é, ou quase tudo :

Entre os assassinados existem pessoas inimagináveis a qualquer escritor de ficção. Pauline Philipe Reichstul, presa aos chutes como um cão danado, a ponto de se urinar e sangrar em público, teve anos depois o irmão, Henri Philipe, como presidente da Petrobras. Jarbas Pereira Marques, vendedor em uma livraria do Recife, arriscou e entregou a própria vida para não sacrificar a da sua mulher, grávida, com o “bucho pela boca”. Apesar de apavorado, por saber que Fleury e Anselmo estavam à sua procura, ele se negou a fugir, para que não fossem em cima da companheira, muito frágil, conforme ele dizia. Que escritor épico seria capaz de espelhar tal grandeza?

Leia também

* Urariano Mota: Crônica para a mulher madura

E Soledad Barrett Viedma não cabe em um parêntese. Ela é o centro, a pessoa que grita, o ponto de apoio de Arquimedes para esses crimes. Ainda que não fosse bela, de uma beleza de causar espanto vestida até em roupas rústicas no treinamento da guerrilha em Cuba; ainda que não houvesse transtornado o poeta Mario Benedetti; ainda que não fosse a socialista marcada a navalha aos 17 anos em Montevidéu, por se negar a gritar Viva Hitler; ainda que não fosse neta do escritor Rafael Barrett, um clássico, fundador da literatura paraguaia; ainda assim... ainda assim o quê?

Soledad é a pessoa que aponta para o espião José Anselmo dos Santos e lhe dá a sentença: “Até o fim dos teus dias estás condenado, canalha. Aqui e além deste século”. Porque olhem só como sofre um coração. Para recuperar a vida de Soledad, para cantar o amor a esta combatente de quatro povos, tive que mergulhar e procurar entender a face do homem, quero dizer, a face do indivíduo que lhe desferiu o golpe da infâmia. Tive que procurar dele a maior proximidade possível, estudá-lo, procurar entendê-lo, e dele posso dizer enfim: o Cabo Anselmo é um personagem que não existe igual, na altura de covardia e frieza, em toda a literatura de espionagem. Isso quer dizer: ele superou os agentes duplos, capazes sempre de crimes realizados com perícia e serenidade. Mas para todos eles há um limite: os espiões não chegam à traição da própria carne, da mulher com quem se envolvem e do futuro filho. Se duvidam da perversão, acompanhem o depoimento de Alípio Freire, escritor e jornalista, ex-preso político:

“É impressionante o informe do senhor Anselmo sobre aquele grupo de militantes - é um documento que foi encontrado no Dops do Paraná. É algo absolutamente inimaginável e que, de tão diferente de todas as ignomínias que conhecemos, nos faltam palavras exatas para nos referirmos ao assunto.

Depois de descrever e informar sobre cada um dos cinco outros camaradas que seriam assassinados, referindo-se a Soledad (sobre a qual dá o histórico de família, etc.), o que ele diz é mais ou menos o seguinte:

‘É verdade que estou realmente envolvido pessoalmente com ela e, nesse caso, se for possível, gostaria que não fosse aplicada a solução final’.

Ao longo da minha vida e desde muito cedo aprendi a metabolizar (sem perder a ternura, jamais) as tragédias. Mas fiquei durante umas três semanas acordando à noite, pensando e tentando entender esse abismo, essa voragem”.

Esse crime contra Soledad Barrett Viedma é o caso mais eloquente da guerra suja da ditadura no Brasil. Vocês entendem agora por que o livro é uma ficção que todo o mundo lê como uma relato apaixonado. Não seria possível recriar Soledad de outra maneira. No título, lá em cima, escrevi Soledad, a mulher do Cabo Anselmo. Melhor seria ter escrito, Soledad, a mulher de todos os jovens brasileiros. Ou Soledad, a mulher que aprendemos a amar.


* Urariano Mota é jornalista e colunista do Vermelho. Autor do livro “Soledad no Recife’, editora Boitempo, que percorre as veredas dos testemunhos e das confissões da passagem da militante paraguaia Soledad Barret pelo Recife, em 1973, e a traição que culminou em sua tortura e assassinato pela ditadura militar.

segunda-feira, março 07, 2011

AVISO AOS ANÔNIMOS

Amigos,

este blog está inciando sua etapa mais ousada, aparecendo para mais gente, entretanto seu blogueiro e curioso ainda não dominou algumas ferramentas interessantes da mídia digital, dentre elas a que permite que o comentário seja lido pelo administrador do blog antes de ser postado.

Digo isto porque hoje um anônimo escreveu um comentário num dos posts e não se identificou. Nada demais, a não ser a impressão que eu tive de um certo tom de intolerância no mesmo (e eu nem dei ainda a minha opinião!): "kd o comentário que vc disse q ia fazer no blog do Daladier, é pura balela". De qualquer forma o mesmo foi excluído, em respeito aos leitores que mostram a cara, como o meu amigo de muitos anos, Daladier Lima.

Em resposta à indagação do comentário, postarei o artigo sobre o Post referido assim que tiver disposição para tal. Espero que seja rápido, mas não tenho horário marcado.

Aprenderei a manusear as tais ferramentas e aviso a todos que este blog tem cara e mostra a cara, assim, comentários anônimos, também os ofensivos, serão deletados.

Grande Abraço.

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

A politica de valorização do Sálário Mínimo a médio prazo.

O Senado Federal aprovou ontem o PLC 01/2011, que trata do valor do salário mínimo para 2011 e sua política de valorização. Foi uma vitória esperada, mas para mim, que acompanhei as discussões e votação, algumas coisas pareceram interessantes:
A primeira, mas não a mais importante, foi o sorriso debochado do Aécio Neves enquanto o Senador e Ex-Presidente Itamar Franco defendia a autoria do Plano Real. O fato ocorreu logo após o paradoxal discurso da Senadora Kátia Abreu (DEM), em que a mesma, tentando emplacar uma suposta e falsa herança maldita deixada pelo governo Lula para o governo Dilma, teceu lôas ao também Ex-Presidente FHC por, dentre outras coisas, ter criado o plano real, raiz, segundo a Senadora, de todos os ganhos e avanços do salário mínimo no Brasil (sic). O Senador Itamar, talvez insulflado pelo Aécio Neves, passou imediatamente a pedir a palavra para defender a autoria do tão falado Plano Real, desmentindo a Senadora Kátia Abreu. O interessante foi a expressão de sarcasmo do Aécio Neves, ao fundo, durante a defesa do Itamar. Ele deveria estar aproveitando a pequena oportunidade para fustigar (ainda mais) as relaçãos entre os tucanos e neotucanos (PPS) de MG e de SP. Forma bem peculiar para tal e pouco comum, em público, entre autoridades políticas.
A segunda, e mais importante, foi o próprio conteúdo do PLC 01/2011. Trata-se de uma das maiores vitórias (senão a maior) dos trabalhadores na história do salário mínimo. Pela primeira vez há uma política clara de valorização de médio prazo de seu valor: A inflação do ano passado mais o crescimento do PIB do ano retrasado. Evidentemente esperava-se um aumento maior para este ano mas, a partir do momento em que a oposição (que achatou histórica e seguidamente o SM em sua estadia no poder) passou a defender um salário demagogicamente maior, os lados da batalha estavam delimitados. O essencial e mais importante era a regra clara até o ano de 2015. As Centrais Sindicais, que cumpriam seu papel exigindo um aumento maior, precisam, agora, ter nítido que foi uma grande vitória para todos os trabalhadores a aprovação do projeto, sobretudo pela sua construção democrática, em acordo com todas as centrais ainda no governo Lula e pela mudança de orientação, isto é, ao invés de indexar suas dívidas com os credores, o governo agora vai indexar o aumento salarial do trabalhador. Sempre com ganhos, desde que a economia cresça. Essa talvez seja a maior vitória. Histórica.

domingo, fevereiro 20, 2011

Governo Dilma x Cafarnaum: Esperança e luz

É notável as mudanças no país nos últimos anos. Tanto é que a oposição, sem bandeiras claras e que unissem a maioria do povo em torno delas, preferiu seguir o caminho do submundo eleitoral no pleito de 2010.
Pois bem, estou trabalhando nos últimos meses na Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - Chesf, que tem cumprido papel fundamental para a possibilidade de nosso país dar um salto econômico e social, que alcançe os rincões e devolva a esperança no futuro do povo brasileiro.
Nesta última semana estive na região da Chapada Diamantina, estado da Bahia, a fim de realizar estudos de viabilidade energética, a partir de fontes eólicas, que reforce o suprimento elétrico na região. Lá, pude ver a esperança de algumas comunidades rurais, especificamente no município de Cafarnaum, que nunca souberam o que é ter um lar com energia elétrica. À luz de lampiões passam às noites, sem geladeira, sem tv, sem poderem atender muitas de suas necessidades básicas, num século cuja marca é a modernidade. Paradoxo persistente. Nas expressões do povo, a esperança num governo que, finalmente, vem atender aos seus direitos, tirá-los do anonimato e incluí-los, como objetivamente ocorreu com milhões de pessoas durante os anos do Governo Lula e continuará a ocorrer durante o Governo Dilma, com mais investimentos em infra-estrutura, inclusão social e erradicação da pobreza, elementos essenciais de um projeto desenvolvido de Nação.